Casa de Tijolo
Primosfera
4’ 15”
Primosfera
4’ 15”
Agosto 2019, Melides. Era o meio do dia e estavam perto de quarenta graus debaixo do sol. Procurava-mos imagens para o filme Prefácio, na Casa de Tijolo ainda em fase de construção. Entro naquilo que parecia ainda ser só a estrutura crua em tijolo nu do que eventualmente viria a ser uma casa, e sinto a temperatura baixar pelo menos uns dez graus. De repente estava fresco, sem ar condicionado ou ventilação, só o poder funcional da arquitectura aliada a um material de construção ancestral, a evocar aquela temperatura do interior das igrejas e capelas ou das mesquitas marroquinas.
A ideia deste sítio começou aí a tornar-se clara, principalmente quando inserida na tapeçaria de ideias que já tinha começado a montar sobre os princípios que sustentam os projectos da Primosfera. Nesse dia, fizeram-se as imagens que estão no capitulo terceiro do filme Prefácio, onde se evoca o poder da obra, e onde as paredes de tijolo de Melides são retratadas de forma abstracta, conceptual, como se só de enormes paredes e aberturas de tijolo se tratassem.
Um ano depois, também no Verão, já a casa está habitada. Não à procura de imagens desta vez, apenas de passagem, a propósito de uma qualquer circunstância. Entro e interrompo um final de almoço tardio, com várias pessoas à volta de uma mesa comprida ao longo de um dos pátios externos da casa, semi-coberto por uma hera ainda demasiado jovem para fazer sombra. A hera, a relva no chão dos pátios e o mobiliário eram as únicas diferenças. As paredes, as texturas e os espaços estavam todos exactamente como na primeira vez, no entanto deixara de parecer a estrutura crua de algo em processo que tinha visto um ano antes. Era uma casa agora.
A Casa de Tijolo começou como projecto de filme no inicio de 2020. A proposta era simples — documentar o tempo, o conhecimento e a arte do método de produção artesanal dos tijolos que estão na base do projecto deste edifício.
Desenhou-se assim o caminho: O tijolo como unidade — simples e elementar mas contendo em si já todos os genes de algo muito maior — uma metáfora para a família.
E narrou-se a sinopse: Numa olaria, um artesão solitário produz, ao ritmo da Terra, um tijolo maciço segundo o método artesanal, mas esse tijolo não é o fim, é o começo.
No coração do Alentejo encontrei a “fábrica” de tijolo. Num terreno perto das margens do Alqueva, uma cobertura onde prateleiras de tijolos secam à sombra, rodeia um forno, também ele construído dos mesmos tijolos que coze. E como se o local só não chegasse, todo o processo é um convite ao registo cinematográfico.
O ritmo é o do Alentejo, mais do que lento, é o da Terra. A receita, a mais simples — água e terra formam cada tijolo, que seca à sombra, por quantos dias precisar até estar pronto para cozer. O fogo que leva o forno acima dos 1000 graus centígrados, é alimentado por troncos de sobreiros e guardado por um homem só durante todo o dia e toda a noite.
Mas o filme tem dois momentos. Se no primeiro, o foco está no interior da olaria, no artesão, nas matérias e nos sons que ali habitam, no tempo que ali se consome; o segundo momento começa onde o primeiro acaba, com o fogo onde o tijolo se coze. Com esse fogo, hipnótico, contrasta o ambiente pacífico e rural do vale onde a casa está e que invade estes espaços, através das muitas de aberturas do edifício. À medida que percorremos a casa, o texto evoca esta contradição entre a simplicidade de uma peça tão elementar, e no entanto tão fundamental para atingir algo maior, numa linha cantada, estrófica, reforçando o sentido da repetição, do tempo, do caminho que se percorre para se chegar a um todo – esse algo maior, que aqui é a “Casa de Tijolo”.
A ideia deste sítio começou aí a tornar-se clara, principalmente quando inserida na tapeçaria de ideias que já tinha começado a montar sobre os princípios que sustentam os projectos da Primosfera. Nesse dia, fizeram-se as imagens que estão no capitulo terceiro do filme Prefácio, onde se evoca o poder da obra, e onde as paredes de tijolo de Melides são retratadas de forma abstracta, conceptual, como se só de enormes paredes e aberturas de tijolo se tratassem.
Um ano depois, também no Verão, já a casa está habitada. Não à procura de imagens desta vez, apenas de passagem, a propósito de uma qualquer circunstância. Entro e interrompo um final de almoço tardio, com várias pessoas à volta de uma mesa comprida ao longo de um dos pátios externos da casa, semi-coberto por uma hera ainda demasiado jovem para fazer sombra. A hera, a relva no chão dos pátios e o mobiliário eram as únicas diferenças. As paredes, as texturas e os espaços estavam todos exactamente como na primeira vez, no entanto deixara de parecer a estrutura crua de algo em processo que tinha visto um ano antes. Era uma casa agora.
A Casa de Tijolo começou como projecto de filme no inicio de 2020. A proposta era simples — documentar o tempo, o conhecimento e a arte do método de produção artesanal dos tijolos que estão na base do projecto deste edifício.
Desenhou-se assim o caminho: O tijolo como unidade — simples e elementar mas contendo em si já todos os genes de algo muito maior — uma metáfora para a família.
E narrou-se a sinopse: Numa olaria, um artesão solitário produz, ao ritmo da Terra, um tijolo maciço segundo o método artesanal, mas esse tijolo não é o fim, é o começo.
No coração do Alentejo encontrei a “fábrica” de tijolo. Num terreno perto das margens do Alqueva, uma cobertura onde prateleiras de tijolos secam à sombra, rodeia um forno, também ele construído dos mesmos tijolos que coze. E como se o local só não chegasse, todo o processo é um convite ao registo cinematográfico.
O ritmo é o do Alentejo, mais do que lento, é o da Terra. A receita, a mais simples — água e terra formam cada tijolo, que seca à sombra, por quantos dias precisar até estar pronto para cozer. O fogo que leva o forno acima dos 1000 graus centígrados, é alimentado por troncos de sobreiros e guardado por um homem só durante todo o dia e toda a noite.
Mas o filme tem dois momentos. Se no primeiro, o foco está no interior da olaria, no artesão, nas matérias e nos sons que ali habitam, no tempo que ali se consome; o segundo momento começa onde o primeiro acaba, com o fogo onde o tijolo se coze. Com esse fogo, hipnótico, contrasta o ambiente pacífico e rural do vale onde a casa está e que invade estes espaços, através das muitas de aberturas do edifício. À medida que percorremos a casa, o texto evoca esta contradição entre a simplicidade de uma peça tão elementar, e no entanto tão fundamental para atingir algo maior, numa linha cantada, estrófica, reforçando o sentido da repetição, do tempo, do caminho que se percorre para se chegar a um todo – esse algo maior, que aqui é a “Casa de Tijolo”.
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